A delação premiada, também chamada de “colaboração” premiada é a designação que se dá ao instituto que permite a redução ou mesmo a isenção de pena do agente que colabora, eficazmente, em uma das hipóteses legais, para a identificação dos demais autores ou partícipes da infração, para a localização ou libertação da vítima encarcerada, recuperação do produto do crime ou para o desmantelamento de associação criminosa.
As hipóteses de delação premiada estão previstas no Código Penal (art. 159, § 4º) e nas seguintes leis extravagantes: Lei n. 7.492/86 (crimes contra o sistema financeiro nacional), Lei n. 8.072/90 (crimes hediondos), Lei n. 8.137/90 (crimes contra a ordem tributária e as relações de consumo), Lei n. 12.850/2013 (crimes praticados por organização criminosa), Lei n. 9.613/98 (lavagem de capitais), Lei n. 9.807/99 (Lei de proteção a vítimas e testemunhas) e Lei n. 11.343/2006 (Lei Antitóxicos).
Historicamente falando, o surgimento do instituto da delação repousa nos Estados Unidos no decorrer das investigações contra a Máfia, a Casa Nostra e outras organizações criminosas, (ARANHA, 2006, p.136). No entanto, a delação premiada existente no direito Norte Americano é diferente da aplicada em nosso ordenamento, haja vista, que lá é possível à realização do acordo diretamente pelos órgãos de investigação, já no Brasil, este acordo, sua ideia pode até nascer ainda na fase investigatória, mas depende do reconhecimento pelo juiz na sentença condenatória.
O Brasil importou este instituto do direito internacional, tendo sua previsão legal inicialmente na lei 8.072/90, em seu artigo 8º parágrafo único – a denominada lei dos crimes hediondos, que possui o seguinte dispositivo legal: “Art. 8º – Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços.” (BRASIL, 1990).
No direito brasileiro, o marco inaugural da colaboração premiada é a Lei 8.072/1990, a chamada Lei dos Crimes Hediondos. A legislação previu duas formas embrionárias de colaboração, previstas nos artigos 7º e 8º. O primeiro dispositivo acrescentou o § 4º ao artigo 159 do Código Penal, o qual trata do delito de extorsão mediante sequestro, estabelecendo que, se o crime é cometido por quadrilha ou bando, o coautor que denunciá-lo à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços. Da mesma forma, o artigo 8º determina que o participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços. O contexto em que surgiu a Lei 8.072/1990 evidencia a conexão do instituto brasileiro com a origem histórica norte-americana. Isso porque, a exemplo do que ocorria nos Estados Unidos na época, havia uma necessidade – ainda que questionável, motivada pela pressão social e forte apelo midiático – de respostas penais mais drásticas à criminalidade em larga escala, o que motivou o legislador a prever a categoria jurídica em exame, para beneficiar o corréu que colaborasse com as autoridades.
A partir desta conjuntura, o direito brasileiro buscou inspiração na experiência norte-americana com o plea bargaining, a qual já era bastante significativa. Foi dessa forma, portanto, que o instituto ingressou no ordenamento jurídico brasileiro.
Na atualidade, a melhor forma de definição do instituto em exame, temos o conceito de Renato Brasileiro[1]:
Espécie do direito premial, a colaboração premiada pode ser conceituada como uma técnica especial de investigação {meio extraordinário de obtenção de prova) por meio da qual o coautor e/ou partícipe da infração penal, além de confessar seu envolvimento no fato delituoso, fornece aos órgãos responsáveis pela persecução penal informações objetivamente eficazes para a consecução de um dos objetivos previstos em lei, recebendo, em contrapartida, determinado prêmio legal(LIMA. 2019. p.808)
No mesmo norte, também é necessário entender o que representa a colaboração premiada juridicamente, isto é, qual função desempenha a categoria no processo penal.
Em resumo, a colaboração premiada comumente chamada de delação premiada é instituto complexo e multiforme, de natureza híbrida, tanto no aspecto penal quanto processual penal, e constitui tanto técnica investigativa como meio de prova, sempre sustentada na cooperação de colaborador com suspeita de envolvimento nos delitos que são objeto de investigação. Tal assertiva de que a colaboração premiada é instituto dotado de notável complexidade, é corroborada pelo próprio legislador, o qual, ao disciplinar a categoria jurídica, previu uma série de requisitos constitutivos, como, por exemplo, a eficácia na solução ou prevenção de demais crimes na busca de um numero maior de autores.
Portanto, conclui-se que a colaboração premiada possui natureza jurídica híbrida, podendo funcionar como meio de obtenção de prova ou como meio de prova, a depender, sobretudo, da fase processual em que é utilizada, bem como da forma com que ocorre a introdução das declarações do colaborador no processo. Se se tratar de depoimento prestado na fase investigativa, perante a autoridade policial ou a acusação, e que se constitui em ponto de partida do acordo (negócio jurídico processual), tratar-se-á de meio de obtenção de prova. De outro lado, quando se fala em depoimento do réu colaborador em juízo, cuida-se de verdadeiro meio de prova, ou seja, instrumento apto a comprovar determinado fato probando, desde que corroborado por provas independentes, como mencionado no parágrafo anterior.
[1] Lima, Renato Brasileiro de Manual de processo penal: volume único / Renato Brasileiro de Lima - 7. ed. rev., ampl. e atual. - Salvador: Ed. JusPodivm, 2019.
Oziel Brito Silva é bacharel em direito, Advogado inscrito na OAB/PR sob nº 85.971, Pós Graduado em Direito Previdenciário, Direito Processual Penal e Direito Público. Contato: (43) 3546-2095.